
Os antigos filósofos gregos, cujo
legado até hoje é incontestável nos âmbitos das ciências
humanas e das exatas, deveriam falar uma linguagem simples, sem artifícios e
sem afetação; delicada, concisa e brusca... Expressar, seja escrevendo, seja
falando, sempre foram questões presentes desde sempre para a humanidade. Muitos
sábios se detiveram nesse tema; quase todos condenaram a verborragia, a
eloqüência desmedida e a suntuosidade verbal. Mas “gosto” tem o aspecto da
individualidade e da particularidade. Não se discute.
Aristoteles,
discípulo de Platão e mestre de Alexandre o Grande, um dia disse: “A principal
qualidade do estilo é a clareza e o verdadeiro sábio procura a ausência da dor,
e não do prazer”. Valho-me, então, dessa clareza, apartado da dor e com muito
prazer, para perguntar ao Filósofo: Como pôde afirmar que a escravidão faz
parte da própria natureza, de modo que o escravo nasce para ser escravo e é na
sua função de escravo que ele realiza finalidade para a qual existe? E que a
natureza em vista da conservação, criou alguns seres para mandar e outros para
obedecer? E com a mesma impiedade, acusa as mulheres ao dizer que elas eram
totalmente incapazes de serem amigas, e que as esposas não podiam se relacionar
com os maridos em nível de igualdade? Não deveria o Filósofo pregar a
“filoginia” (igualdade intelectual do homem e da mulher), ao invés de
“misoginia” (Desprezo às mulheres)? Ainda bem que parte da sua obra foi
perdida...
Com o francês, René
Descartes, queria muito aprender seus métodos matemáticos de conhecimento.
Entretanto, a sua afirmação que só se deve considerar algo como verdadeiramente
existente e duvidar de todos os conhecimentos que não possuem explicações
evidentes, cabem-me a pergunta: O Senhor tomou a decisão de fingir que todas as
coisas que até então haviam entrado na sua mente não eram mais verdadeiras do
que as ilusões dos seus sonhos. Deus existe, ou é também é um sonho? Devemos
confiar na sua existência, mesmo sem nunca termos visto? O seu método cartesiano
consiste no ceticismo metodológico;
e como distinguir o mito do verdadeiro nas questões deísta, já que não podemos
provar a existência de Deus? É possível conviver em harmonia apartado da
fé? A fé é, sem dúvida, a aceitação
imediata de um fato não comprovado, mesmo que naveguemos pelo princípio da
incerteza. Acreditar em Deus, não é melhor que acreditar no Filósofo Descartes?
Mesmo sem conhecer, eu prefiro Deus...
A Diógenes,
certamente eu lhe diria: de todas as suas anedotas, fazer da pobreza extrema
uma virtude e não ser nem ateniense nem grego, mas sim um cidadão do mundo, me
faz seu fã incondicional... Todo cidadão deve considerar-se cidadão do cosmo...
Ficaria, certamente, eqüidistante, para que eu não lhe fizesse sombra,
impedindo-lhe de ver o Sol, tal qual fez Alexandre; contudo, lhe acompanharia
pelas ruas, com a sua lanterna acesa, à procura de um homem que fosse honesto e
feliz...
Estando com Blaise Pascal, eu
agradecer-lhe-ia pela criação da calculadora e pedir-lhe-ia explicações mais
amiúde da sua teoria das probabilidades, pois vivemos, hoje, no mundo onde a
verossimilhança nem sempre é aceita... Por isso, lhe assiste razão, pois, em
afirmar que “o silencio mais vale que a fala”... Diria, ainda: Quão feliz foste
ao dizer que o prazer dos grandes homens consiste em poder tornar os outros
felizes. Isso é tudo.
Pitagora,
que me adjutorou no curso de Direito. Ah! Como eu gostaria de ter estudado na
sua Escola de pensamento, sentar na primeira fila e perguntar-lhe: Mestre o que
é Justiça?..
Por fim, conhecer
Platão era o ápice. A sua sofisticação como escritor é sem precedente; é
singular; é impar em todos os seus diálogos, sobretudo quando discorre sobre a
realidade do homem, com a teoria das ideias, afirmando que a inteligência e a
sensibilidade são inerente a natureza humana...
O meu falar
sozinho com os grandes vultos fôra deveras extenso. Falei com Hengel, Hobes,
Kant e Johon Loche e Jacques Rousseau. Todos fizeram silêncio de oração para me
ouvir confabular com Sócrates, já que tudo em sua vida é envolvida por
mistérios. Desprovido de vaidade, nunca proclamou ser sábio; disse-me que a sua
sabedoria era limitada a sua própria ignorância. Afirmou “saber que nada sabe”
e incentivou-me a conhecer meus conhecimentos dizendo-me: "Conhece-te a ti
mesmo, Manoel Lobo". Mas eu queria mesmo era conhecer o homem que
enfureceu a democracia ateniense com seus questionamentos e métodos. Até Paulo
o apostolo escreveu algo similar: “E, se alguém cuida saber alguma coisa, ainda
não sabe como convém saber” (1Co.8:2). Depois disso, quem pode bater no peito e
dizer que sabe qualquer coisa?
Deixei os Filósofos e fui para a acrópole de Atenas, no alto do Parthenon, confabular com os Gregos Deuses:
Deixei os Filósofos e fui para a acrópole de Atenas, no alto do Parthenon, confabular com os Gregos Deuses:
Hermes, guardião
dos oradores e escritores, juntou-se a Apolo, que como patrono da música e da
medicina, versou a meu respeito com conhecimento tão catedrático, que me fez
adormecer... Até Poseidon, tido como um deus traiçoeiro recebeu das mãos de
Dionísio, uma taça de vinho para brindar a minhas ousadas indagações, que
deixou Afrodite embriagada de amor. E, quando menos eu esperava, uma bola dos
Céus descia iluminando toda a acrópole para anunciar a chegada de ZEUS, o
principal governante do Olimpo, Rei dos deuses que bradava: “Manoel Lobo”
também é Deus, vindo da antiga Cidade de Ifé, ao sudoeste da Nigéria!
Dar-lhe-ei todas as honras merecidas e farei com que o mundo conheça o seu
relicário de ousadias...
Até aqui, tudo
foi por mim registrado com galhardia. Contudo, ainda, não posso epilogar o meu
escrito, sem antes, porém, discorrer sobre o panteísmo do Candomblé e dialogar,
também, com os Orixás. Não me assiste razão, pois, desconhecer a magia dos
povos Nagôs, Ketu, Bantu, Angola e do Congo. Meus ancestrais...
Estou, agora, sentado no centro da
Mandala, ouvindo a liturgia dos “Babalorixás” e “Yalorixás” sobre as forças da
Natureza e a epopéia da sua cultura, esbulhada pelos Faraós da Casa Grande, que
ainda mantém suas senzalas...
O primeiro a usar o púlpito foi o
Orixá Ogum, deus da guerra e dos caminhos, cujo sincretismo é Santo Antonio;
Santo que inspirou o nome do meu genitor. - Com a sua “obé” empunhada, dançando
no compasso do atabaque para saudar-me com uma saudação de paz franciscana e
dizer-me que todas as terças feiras “Ele” é comigo e levar-me-á a perspicácia
de versar o amor.
Depois é a vez de Xangô, Senhor da
Justiça, com o seu machado de dois gumes empunhado, que sabendo da minha dúvida
e curiosidade, de pronto respondeu: Manoel Lobo, a Justiça é, antes de tudo,
uma característica possível, porém não necessária, de uma ordem social...
Seguido por Erê, o deus protetor das
crianças, que no sincretismo é também conhecido por Cosme & Damião,
trajando-se na cor verde e dourado, tendo-o nas mãos, palma de Santa Rita,
pronto para felicitar-me pela dedicação as crianças e ungir a minha cabeça com
ungüento santo. Oportunidade em que lhe questionei sobre o padecer das nossas
criaturinhas, que não bastasse nascerem pobres, por serem negras, são
abandonadas à própria sorte por determinação dos Faraós...
Na seqüência, conheci os Orixás Oxum,
Nanã, Iansã e Oxossi. Deuses que dominam as águas doces, as matas, a
fertilidade, a riqueza, os ventos, as tempestades, as paixões e aventuras, a
vida e a morte. Conheci, também, Omolú, o deus protetor dos leprosos, que
atende também por São Lázaro. Ele repetiu para mim, as palavras do Cristo
Senhor: Manoel Lobo, “deixe que os mortos enterrem seus mortos”, fazendo uma
patente alusão ao caráter necrosado dos Faraós dos nossos tempos. Na
oportunidade, pediu-me para usar a caridade e piedade como um bálsamo para os
que padecem...
A esta altura, a minha voz entrecortada
não mais ecoava uma frase inteira. Tomado de êxtase, aos poucos me refiz para
receber a protetora dos Lares, Mãe de todos os Orixás, com seu reluzente
vestido azul e branco, instrumentado com o seu Abebé (abano de prata), pronta
para me explicar tudo do que é composto o Cosmo. - EU estava diante de YEMANJÁ,
a Nossa Senhora da Conceição; da concepção; que concebeu o filho de Deus...
Então eu disse: Ave Maria! Bendita sois dentre as demais!..
Ela enxugou as minhas lágrimas de
emoção e me mandou olhar pra cima e ver quão lindo é a ribalta iluminada para
apresentar-me o novo; o eterno; o Pai Celeste chamado Oxalá. Pai de todos os deuses, criador dos céus e da
terra, que me disse, firmemente, em poucas palavras, que Eça de Queirós foi
feliz quando afirmou: - "É na natureza que se deve procurar a religião:
não é nas hóstias místicas que anda o corpo de Jesus - é nas flores das
laranjeiras."
Desta maneira, então, conheci os
dignos, falei de tudo com todos e comprovei que a certeza não é a substância ou
a essência da experiência humana. A locomotiva da razão carece de fé como
combustível de seu motor.
Finalmente, por mais que me
deliciasse com os sábios filósofos de outros séculos e deuses de todos os
credos, alinho-me com a experiência de um conterrâneo chamado Deusdete. Ele tem
maior capacidade de albergar a minha alma... Deusdete, ou simplesmente Dete de
Anselmo, como era conhecido na minha Santo Estevão, era um sábio homem com a
cara de paz. De paz ele entendia, porque ele entendia de povo e de pobreza. Era
um homem simples e bom.
Nós, homens do conhecimento, disse
Nietzsche, não nos conhecemos; de nós mesmo somos desconhecidos... O fato é que
não há verdade absoluta sobre as coisas. Cada qual vai aprendendo da sua
maneira a melhor forma de tocar os seus dias, dizia “seu” Dete, que não teve
ninguém pra lhe ensinar e com o mundo, foi aprendendo a ser sábio pra comprovar
a máximo: Não existe saber mais ou saber menos; existe apenas saberes
diferentes. Ninguém sabe mais ou sabe menos; cada um sabe um pouco. A maior
sabedoria mora com gente humilde.
Em toda a minha vida, jamais vi
alguém mais educado que Dete de Anselmo.
Tudo que sabia, aprendeu, com o encorajamento, com as coisas que ele
queria aprender, quando quis aprender, da forma que soube aprender... Aprendeu
e conquistou um caráter humilde para lidar com as relações morais e éticas.
Com sabedoria de homem comum, para
ele, na natureza tudo está como deve estar. Ele compreendia as coisas pela
simples razão delas existirem; não preocupava em dar provas do seu próprio
pensamento. Isso é sabedoria; isso é filosofia; isso é poesia; etc e tal...
Os sábios e os pensadores, acima
citados, parecem, portanto menos avançados que “seu” Dete; já que eles próprios
não tinham a certeza em relação a si mesmo e do que pretendiam provar... Eles
passavam metade da sua vida a analisar, uma a uma, as pequenas coisas, a
verificar tudo o que já se sabe; e a outra metade passava colocando os
fundamentos de tudo que foi dito, ensimesmados no vazio...
Para aquela
gente, gregos e romanos, acreditar nos deuses se resumia a um pressentimento de
que um ser bom está no comando. E por intuição tomavam decisões e acreditavam
que os deuses protegiam os que lhes buscavam com fé e oferendas... Dete era
diferente; nunca se interessou pela questão “deísta”, sobretudo, nos aspectos
bíblicos. Ele acreditava em Deus Jesus e nos Orixás. Pouco se importava com a
lógica divina da Trindade. “Conhecereis a verdade e ela vos libertará”. - A
verdade que ele conhecia, lhe outorgava o “passaporte” para a salvação.
Todo o domingo,
desde os tempos do Padre Odulfo, lá se ia “seu” Dete, pra Missa, encontrar o
seu Deus, para pedir e agradecer. Sem oferenda, sem sacrifício, ele apenas
ajoelhava, rezava um pai nosso e duas ave Maria e voltava pra casa contente e
tranqüilo. Todo setembro, fazia o “caruru” de Cosme e Damião e levava a sua
oferenda para o seu Orixá. E assim, seu Dete agradava a todos os deuses, sem
questionar a suas existências...
Enquanto
os sábios viviam solitários, tristes e angustiados, Dete era feliz e tinha
muitos amigos; dentre eles, Ademilson Santiago, que não dispensava a sua dileta
companhia nas noites românticas de Santo Estevão. Dete tinha um estilo de vida
caracterizado pela despreocupação com relação a bens materiais, grandes
projetos e as normas convencionais. Tinha um coração boêmio, uma alma poética,
inquieto, repleto de sonhos, e uma aura de fluidos sentimentais intensos. Ele
não era um gênio, era boêmio românico como os poetas! Um sábio que eu conheci
!!!
Por Manoel
Lobo.
São
Paulo, 28 de março/2014
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